domingo, 15 de maio de 2011

Contos

Aquilo que vive atrás da porta.

Os ruídos que escuto e provem do quarto ao lado sempre me causam inquietação. Acontecem em horário específico, todas as noites, à mesma hora, duram o mesmo espaço de tempo, todos os dias. Cerca de meia hora. Depois, cessam misteriosamente e ouve-se apenas o silêncio absoluto.  Nunca durante o dia. Somente à noite e no mesmo horário. Algo vive naquele quarto certamente. E por algum propósito provoca-me com o barulho. Parece saber que espiga minha curiosidade. Percebe-se que o quarto é iluminado. Vejo pela fresta da porta. Uma porta separa os dois quartos. Uma porta que nunca é aberta. O acesso me é negado, terminantemente. Não me é permitido abrir tal porta, única porta que separa os quartos, único vão acessível. É nessa porta que os barulhos se produzem.  Aquilo que vive atrás da porta, nela bate para me provocar, todas as noites. Não me causa pânico, medo ou temor desmesurado.  Apenas uma curiosidade agônica.  Somente uma porta me separa daquilo que vive atrás e me é impossível ver.  Não me permitem ali entrar, de forma alguma. Neste meu quarto, embora pequeno mas provido de banheiro, e cuja mobília reduz-se a duas mesas,  uma pequena outra um pouco maior, e alguns tapetes; nele posso tudo. Faço o quero  e como quero. Mas apenas em meu quarto. Quase não me permitem dele sair.  Passo aqui minha vida, recluso. Não a contragosto. Bem, às vezes a contragosto, aí rebelo-me, grito, peço para sair, imploro que  me deixem deixar o meu quarto,  passear pelo quintal da casa. Poucos instantes, e estaria satisfeito. Mas nem sempre me atendem. Mandam-me calar. Resigno-me. Afinal, eles me sustentam e me alimentam. Despreocupo-me com a sobrevivência.  Não reclamo! Até que me tratam bem... com carinho. Conversam comigo... algumas vezes até  me afagam. Outras me deixam sair, mas raramente. Nessas poucas ocasiões observo a rua, o movimento, à vida lá fora, o mundo parece enorme e infindável e confuso. Cá, embora recluso, não corro riscos. Nada temo já que nada pode me acontecer de imprevisível.  Somente a morte, um dia, mas, isso é previsível e até suportável. Dir-me-ão que não vivo por que recluso. Digo, vivo e não corro risco, não sofro. Acaso para se viver há que se sofrer, correr riscos, conviver com o imprevisto?  Suportar e superar experiências duvidosas, quase sempre danosas?   É certo, contudo, que não compartilho minha existência com outros seres.  Eles, os outros, nada sabem de mim, - sequer que existo -, eu, também nada sei deles. Assim vivo.  A solidão por companheira única. Só que a solidão não me magoa. Algumas vezes entristeço-me com minha aceitação passiva dessa reclusão.  Logo passa....  acostumei-me a isso.  Prefiro antes este meu pequeno quarto que o mundo lá fora. Aqui reino absoluto. Tenho o controle de todas as coisas. O acaso não interfere. Domino todas as situações. Não padeço de desilusões de relacionamento. Não há feridas provocadas por estranhos. Não há o sofrer por conta dos outros. Sim! Não há inferno porque não há os outros. Nada aqui acontece que não me possibilito resolver. Nenhum fato, acontecimento ou situação me subjuga, me comprime.  Exceto esse. O bater. As batidas daquilo que vive atrás da porta. Nunca vi aquilo.  Jamais me permitiram.  Esses que me impedem de abrir a porta, os mesmos que me mantém preso em meu quarto. Eles, só eles, têm a chave, assim, abrem quando bem lhes apraz.  Eles, penso, serem meus pais. Pelo menos outros eu não conheci. Somente eles, que me mantém cativo. Creio que assim fazem para me proteger. Embora jamais me perguntassem se assim o queria. Simplesmente por mim decidiram. Ponto final.  São... são sim dominadores,  mas, tratam-me bem. Recusam-se a falar-me sobre o que há atrás da porta, nesse quarto. Certa feita, a porta que separa os quartos foi deixada entreaberta. Espiei pela pequena fresta.  Pude ver aquele continente insólito e desconhecido. Maior que este, o meu. Nada ali se movia. A iluminação era parca, quase nenhuma, mas podia-se ver a disposição dos móveis apesar da penumbra.  Tudo imóvel, inquietantemente imóvel. Afora uns sons guturais, estranhos e inexplicáveis, nada ali parecia viver.  Os sons... se me transfiguraram tenebrosos.  Estanquei.  Assolou-me um medo e um pavor atroz.  Recuei.  Assustado, guardei comigo minha curiosidade.  Passados alguns fôlegos, fechou-se a porta tornando inexpugnável, a mim, a entrada por essa passagem de madeira.   Penso que ali vive uma criatura medonha.  Aquilo que vive atrás da porta! .... Eia!!... Ei-lo a bater novamente. Ouves? Está ouvindo? Está a bater.   Respondo-lhe, mas mudo queda-se.  Volta a bater. Só bate. Nada mais. Aquilo que vive atrás da porta. Tive oportunidade de saber e perdi-a por medo. Deveria, acaso, naquela única oportunidade, ter aberto a porta, escancarando-a  de uma vez por todas?   Às vezes,  o medo do desconhecido confina-nos à segregação mais do que qualquer cárcere.  Prefere-se não saber a sofrer com o conhecimento. Retirar o véu misterioso que encobre a realidade pode causar extrema decepção.  Cai-se o encanto, vê-se tão-só o lugar comum.  O incognoscível, enquanto o é, medra a imaginação e o sonho e as conjecturas íntimas.  O cognoscível não atrai, ao contrário, desilude por sua própria transparência, pelo seu permitir se conhecer.  O ser precisa do mistério, do desconhecido.  O conhecimento embota a visualização das qualidades do conhecido, do próximo, por que  provoca falsas presunções, conjecturas hipotéticas e julgamentos errôneos. O conhecimento, mesmo que presumido, arrefeça aquilo que se pensa conhecer, obrigando a enxergar tão-somente os defeitos... a magia só existe e persiste naquilo que não se conhece.... Veja!  Lá está. Imutável, inalterável, incontrolável, sempiterno desconhecido. Aquilo que vive atrás da porta!  A bater...  a  bater ....  a  bater....     


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Uma noite ... apenas

Ela não conseguia conciliar o sono. Os poucos minutos que deitara, revolvera continuamente na cama. Pressentia algo. Sem saber exatamente o que de terrível poderia lhe acontecer naquela noite, rondava os cômodos de sua casa, inquieta e incomodada, em desespero incontido e frenético. Sentia o inevitável. A qualquer instante a tragédia se abateria. Tinha a certeza instintiva do perigo iminente. 
Era uma loura bonita e bem talhada, e sentia orgulho e carinho de seu corpo esbelto e sensual.
Repentinamente, bateram à sua porta, e as batidas eram insistentes, fortes, repetidas e assustadores, como se forçassem um arrombamento.
Ela sentiu, então, que o perigo que era iminente estava prestes a acontecer. Eles, sem dúvida, entrariam e a encontrariam. Desnorteada, procurou um abrigo, um esconderijo em sua própria casa, sem êxito. E a porta foi aberta, abruptamente.
Fitou ela os rostos dos invasores, porém, não conseguia distinguir-lhes as feições, pareciam-lhe enormes, disformes e medonhos; e o medo assomou-lhe o ser.
Precipitou-se pelos cômodos correndo desvairadamente, derrubando cadeiras, jarros, trombando em móveis, esbarrando nas coisas, perseguida pelos estranhos desfigurados.
Não conseguia articular um único som, nem imaginar uma defesa contra seus agressores.
Trancou-se em seu dormitório, encolhendo em sua cama, apavorada. As paredes do quarto pareciam mover inclinando sobre ela.
Um estrondo enorme obrigou-a a olhar para a porta. Percebeu, então, que o estrondo era a porta sendo derrubada e os horrendos indivíduos se acotovelavam na passagem para invadirem o quarto. O vão da porta derriçada para pequeno e estreito e os invasores pareciam nem caberem nos umbrais. Forçavam entrada.     
Viu-se rodeada e acuada, fechou os olhos e entregou-se à sua sorte. Sabia, agora, que o seu medo e pavor de minutos antes, de que um acontecimento terrível a vitimaria era real e estava por ocorrer.
Um silêncio espectral se fez presente, como um vácuo, nada se ouvia senão sua respiração ofegante e as batidas do seu coração. Juraria ela que, naquele momento, podia ouvir até o sangue circulando em suas veias.
Os segundos que transcorreram envoltos no mais profundo silêncio pareciam eternos. O silêncio era opressor, sufocante, aterrador.
Minutos vários se passaram, e sentia ela como se trancafiada viva em uma tumba.
A expectativa do inevitável fez com que abrisse as pálpebras.
Ficou estupefata, muda, abestalhada.
O quarto estava vazio.
Não havia ninguém.
Que teria sido aquilo? Alucinação? Teria sido um temor infundado, uma paranóia, um delírio alucinante? Ainda deitada na cama, banhada de suor e colada ao colchão, rígida e imóvel, olhando o teto apenas o rosto singelo de um menino desconhecido fitava-a com um sorriso desdenhoso suspenso no ar.
O rosto singelo do menino encerrava olhares demoníacos, sarcásticos, amedrontáveis.
Sentou-se na cama, e ainda petrificada, em pânico, examinou o quarto e tudo estava na mais perfeita ordem.
Acariciou os longos loiros cabelos e percebeu-se ilesa, intacta. Seu corpo continuava imaculado, sedutor, embora encharcado de suor.
O despertador soou estridente, dentro do quarto, enchendo o ambiente com o som cotidiano e rotineiro do dia que surge. 
Recobrou os sentidos lentamente. Olhos abertos, o senso atabalhoado, pensamentos girantes a girar, diminuía o ritmo, desacelerava, para dar lugar à consciência.
Estava em sua sala, largada, sozinha, jogada no sofá.
A televisão permanecera ligada durante toda a noite.
Sua mente era ainda uma confusão total, não conseguia se encontrar, tudo parecia diferente, as formas dos objetos, a iluminação. Seu próprio corpo parecia pesado e flácido, empapado de suor. Era como se estivesse em outra dimensão, em algum mundo paralelo estranho e desconhecido.
Dirigiu-se ao banheiro, tropegamente, cambaleante.
Pouco a pouco recobrava os sentidos. Recuperava a lucidez da própria existência.
Havia sonhado. Tivera um pesadelo inimaginável, indizível.
Fitou-se demoradamente ao espelho, contemplando o rosto.
Gostava de ser refletida, Não a entediava olhar-se nos espelhos, afinal as pessoas se vêem, ao miraram-se em um espelho, não como realmente o são, mas como se imaginam serem, vislumbrando a imagem refletida não como se lhes apresenta,  e sim nos contornos e formas criadas em seus inconscientes.            
Afagou com ardor e gosto sua espessa barba grisalha, os pelos de seu peito, seu membro viril.
E suspirou aliviado. O tormento findara-se!  Disse ele então para consigo mesmo: - Cacete... Que sonho esquizofrênico.
O vento trazia da rua o barulho do dia amanhecido. O som das buzinas e dos carros a passarem, do cotidiano, chegou aos seus ouvidos como música.
Nunca dantes tivera tanto prazer em vivenciar sua própria rotina.
E alegre, embora ainda meio zonzo e perplexo, banhou-se e saiu para a vida. 
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Périplo de almas

“A estória de um homem é a recordação de sua desídia, sofrimento, angústia, desilusão. Poucos memorizam os momentos felizes de suas vidas. Os momentos felizes perdem-se no esquecimento, no vácuo da memória, sombreados pela dor do cotidiano”. ( O narrador-personagem).

A noite incidia a episódios tormentosos. Chegara para o meu turno um pouco adiantado, mas decidira aguardar o esvaziamento da repartição.  Em anos anteriores, quando acreditava ainda e piamente que ao exercer minha função laborava para modificar a  natureza humana e proporcionar lenitivos às conturbações mentais, teria assumido o trabalho e posto minha atenção a auscultar o íntimo daquela gente, a ouvir  lamúrias e queixas qual confessor. Contudo já não mais acreditava na menor possibilidade de ajuda àqueles espectros, por isso, acendi um cigarro e pus-me a tentar distrair-me mentalmente, fingindo não ver o que via, nem ouvir o que ouvia. Melhor seria recordar a letra de alguma música, tentar lembrar um poema, do que ouvir os gritos, gemidos, queixas, resmungos, enfim, ouvir a voz daqueles perturbados. A gente prefere sempre mascarar a realidade porque fria e dura. Poesia parnasiana ao invés de poesia concreta. Preferível o sonho à pedra. Apenas pedaços e frases esparsas ulularam em minha memória. - “...Vês, ninguém foi ao enterro de tua última quimera ...   somente a ingratidão, essa  pantera...”. E assim, preparei-me para adentrar àquela arena. Naquele momento, somente o incognoscível da metafísica me fascinava... ainda; o indivíduo, mau cheiroso ou perfumado, bêbado ou sóbrio, me repugnava e me era indiferente, os acontecimentos que estavam, naquela hora, a desenvolverem-se, ocultos, pela cidade, e cujos resultados certamente seriam vislumbrados horas depois, me assolavam como suplício, castigo, imposição.
Criara um hábito de postar-me a analisar a natureza daquelas pessoas, suas condutas, maneiras, trejeitos; utilizando-as como cobaias na tentativa  de perquirir-lhes as almas,  os sofrimentos, os sonhos, as desilusões, buscando naqueles fantasmas respostas às questões insondáveis da existência humana.
Lancei ao longe a bituca, displicentemente; procurei ver as estrelas delevelmente ofuscadas pela iluminação da cidade, atirei um olhar à lua, como se último fosse, e entrei.
Pouco tempo bastou para que os corredores se apinhassem de gente.
O som rotineiro e conhecido daquele ambiente se fez ouvir claramente. Choros, reclamações, gritos de dor, xingamentos, os mesmos de sempre. Contínuos, secos, intermitentes. Quando o silêncio se faz presente, e a quietude domina aquele local, mesmo nessas horas, o ambiente parece ressoar os conhecidos sons, parece impregnado, paredes, móveis. Pessoas ali circundando ou paradas, inertes à própria situação. E, ao fundo, escuta-se soturnamente botas agressivas, frias e alertas, subirem escadas, marchando, impávidas, cumpridoras do dever,  entre a multidão de desesperados. O chão sempre parece ecoar os mesmos passos. É que o prédio transmuta-se, não raramente, porém quase sempre,  em um liquidificador gigante, a processar sentimentos humanos: ódio, revolta, mágoa, absorção, tortura, dor, paciência, temor, pena, indiferença, piedade; misturando todos esses ingredientes como que para obter uma fórmula diabólica de veneno humano.                       
A mulher da direita levantou-se do banco de alvenaria, e dirigiu-se ao balcão, direta, exibindo o rosto lesado, o olho esquerdo intumescido por um hematoma enorme.
---- Qual o seu nome, dona? Endereço? A que horas a senhora foi agredida?
---- Meu amásio... chegou em casa bêbado e não sei bem por quê me bateu, começou a brigar, a xingar, sei lá.
---- Ele sempre faz isso, dona?
---- Sempre. Ele é bom, mas bebe...
---- Então porque a senhora ainda teima em morar com ele? Porque não o abandona? Bota ele prá fora. Quantas vezes a senhora já veio aqui reclamar? Isso não adianta nada. Não vai resolver nada...
A mulher quedou-se muda a um canto. O balcão estava entupetado e tomado de pessoas e todos ali podiam ouvir a estória, já considerada tão banal pelo burocrático sistema. Nada, de fato, se faria, senão que compilar anotações daquele relato.
Ao lado da mulher, policiais postaram um grupo de quatro adolescentes e exibiam um vasilhame contendo uma beberagem que haviam feito uso. Os meninos, alheios a qualquer coisa que não fossem eles próprios, riam do nada, alucinados que estavam com o chá de beladona que haviam bebido.
Nesse tumulto, surgiu o delegado que despontou da sala onde se encastelara absorto. Um dos quatro, um negrinho forte e risonho, fixou o olhar para o semblante daquele homem engravatado, e gargalhando, disse:
----- Olha, olha a cabeça dele.  Tá saindo um monte de cobras da cabeça dele.
Na sala ao lado, um homem aguardava ser conduzido à cadeia. Minutos antes havia ele matado sua mulher, na sala da própria casa, na frente dos filhos, com uma faca de cozinha. A mesma faca que usava com os alimentos, queria o homem usar contra sua mulher.  Os motivos que provocaram esse homem ao homicídio eram, ainda, nebulosos.
O tempo escasso pouco permitia para que se conjecturasse sobre a motivação do criminoso, os fatores emocionais  e externos que enredam a alma humana ao cometimento de um crime.
Em outra sala, mais assemelhada a uma masmorra disfarçada, um rapaz aguardava o momento de ser  interrogado pelos policiais, acusado que era de ter roubado uma loja.  Esse rapaz pressentia o terror, porque experimentara a sensação de ser esbofeteado, agredido, insultado, e obrigado a confessar seu ato e restituir o dinheiro da loja. Ninguém lhe perguntou motivos, ninguém lhe indagou fome, miséria, nada. Quebrara ele um código de postura da sociedade, um norma de comportamento, então era ele belicoso, fosse ou não, esfomeado ou não. Que importa isso? A quem interessa saber se esse pilantra tinha algum motivo sórdido ou excludente para  apropriar-se do que não lhe pertencia.     
A porta que guarnecia essa sala era uma cela que dava para um dos corredores, de modo que, outras pessoas que ali estavam, ou que adentravam por aquelas dependências, podiam vislumbrar a figura do moço algemado, que caminhava naquele restrito cubículo,  feito um bicho em exposição zoológica.
Outras dezenas de pessoas, homens e mulheres, das mais variadas formas e características físicas, ali aguardavam a vez de confiarem suas ansiedades e percalços.
Em meio a esse mercado árabe, essa feira-livre de almas, caraminholava eu comentários aleatórios e indistintos àqueles miseráveis, na tentativa de fazer ouvidos moucos às lamúrias daqueles estranhos.        
---- A estória de um homem é a recordação de sua desídia, sofrimento, angústia, desilusão. Poucos memorizam os momentos felizes de suas vidas. Os momentos felizes perdem-se no esquecimento, no vácuo da memória, sombreados pela dor do cotidiano. Não me é possível admitir que todos são maus ou todos são bons, ou parcialmente maus e parcialmente bons. O que difere um homem de outro é o peso do fardo que carrega em sua existência. Os momentos felizes da vida de um indivíduo assemelham-me a oásis onde o carregador deposita sua carga e descansa os músculos fatigados, poucos minutos na imensidão da existência que parece eterna.
Em meio a esse burburinho e confusão, um homem branco, caucasiano, é apresentado já contido e dominado e imobilizado por dois policiais, levado arrastado corredor adentro e deixado no chão, como se houvesse necessidade de provar ao obtuso senhor sua insignificância.
Perguntou-se então, aos exibidores do homem sobre o motivo de ser ele conduzido até ali, e a resposta foi que estaria aquele homem alto, branco, forte, pilotando uma motocicleta em alta velocidade, e por isso foi perseguido. Nada crucial tinha feito aquele sujeito.
- Fez o quê, ele? Pilotava uma moto.
-Vocês não tinham nada melhor a fazer, não?
-Perseguir moto?
-Tenha dó, vão plantar batatas.
Foi quando, nesse instante, o homem ali deixado, indiferente ao que ocorria à sua volta, entoou um canto, mesclado de palavras desconexas e frases de orações.  Qualquer pessoa assentiria que se tratava de um insano.
Não que lhe faltasse razões, posto que o louco possua razões próprias da realidade paralela em que vive.                                 
O delegado, soberbo e metido, afinal autoridade ele era, escudado por sua reluzente gravata e distintivo pendente do pescoço,  saiu ao corredor, deixando a sala provida de ar-condicionado, e imperativo, bradou: --- Vou atuá-lo em  flagrante. Referia-se ao doido que jazia no chão, e cantava em línguas estranhas. Os outros casos...  que se danem os outros casos. Mulher de malandro que apanha todo dia... que é que tem isso? Ladrãozinho safado? Deixa prá lá. Vou cuidar é desse!
E se manteve irascível em sua decisão, debalde insistentes argumentações para que deixasse o homem ir-se  sem  mais  delongas.
Retornou o delegado para o claustro de seu gabinete refrigerado, à espera que a multidão se disperse tão logo fosse atendida em suas pretensões.
Ia mesmo, decidido e firme, iniciar a resolução burocrática do caso do homem que pilotava a moto, e que aguardava pelo corredor cantando e rezando em língua estranha.
Poucos minutos se passaram, e uma fedentina insuportável encheu o ar, e o mau cheiro propagou  pelas dependências  do prédio,  cujo fedor aumentava de intensidade a cada instante.
Compelido pelo fedor que assolava a sala, o delegado dirigiu-se ao corredor curioso para saber e descobrir o que produzia tão horrível cheiro.
O homem que ali estava, ao chão, ao vê-lo, levantou-se. A zelosa autoridade soltou uma imprecação  precedida de um berro, e  todos atentaram naquela direção, ao lugar onde estavam.
-----Puta que pariu!  Filho da  puta!  Alguém  põe esse louco prá fora!  Sai daqui. Vá embora!
E saiu,  o  delegado,  golfando vômitos pelos corredores.
Olhamos. Só então olhamos, Só então é que a atenção voltou-se para o homem que aguardava no corredor.
Ninguém soube dizer, nem apurado foi, e nunca se descobriu se o doido tinha defecado. Fato é que com a própria bosta, ou a merda de outra pessoa,  lambuzou o rosto e a cabeça,  e aplicou ao cabelo fezes como se brilhantina ou gel.
Ninguém mais quis saber coisa alguma, o homem foi liberado. Alguém lhe mostrou a saída.  Ele, prontamente, pronunciando seus cantos,  dirigiu-se para fora do prédio, indo embora.
Alguns minutos depois, desci as escadas chegando à calçada. Acendo um cigarro. A noite ainda era calma, pensei. Dei as últimas tragadas e lancei fora o cigarro. Olhei à lua e ela ainda estava lá. 
Voltei  as  costas  à  rua e direcionei-me para a escada.
Ancorei meus ossos em uma cadeira giratória, estralei os dedos, acomodei-me.
---- O próximo! Chamei.


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ABRA A PORTA!

A garota deitou-se sobre a grama do pequeno aterro próximo à sua casa, donde observava todo o horizonte poente. Estava completamente imóvel, olhando o azul celeste límpido, com a mesma atenção que uma criança emprega a tudo o que vislumbra.
De seus olhos penetrantes, sorrateiramente, lágrimas rolaram soltas e rebeldes.
Nesse instante, o homem aproximou-se lentamente, e mudo e absorto, soltou seu pesado e flácido corpo ao lado da bela pequena moça.
Imperou-se um silêncio tristonho e esmagador, os dois seres introspectivos ouviam apenas o murmúrio do vento e o chiar de insetos.
Trocaram um longo e perscrutador olhar, e, no silêncio que os envolviam, suas faces banharam-se num pranto doloroso e estranhamente depressivo.
Ainda a soluçar, pôs-se o homem à acariciar o rosto suave da menina e a beijar, carinhosamente, suas mãos.
O céu tingia-se de vermelho, e a criação,  mais uma vez, fornecia dadivosa o espetáculo visual tão belo quanto a madrugadora aurora.  ----  Pena que o homem já não sinta e veja a beleza das coisas simples,  em toda a sua plenitude e esplendor.
Após vislumbrarem o sereno entardecer, levantaram-se, os dois.  Simultaneamente, quebrou-se o silêncio imperativo.
---Perdoe-me! Disseram.
As palavras se chocaram, ditas com emoção e concomitantemente. 
E um abraço conciliador os uniu por alguns minutos.
Trocaram um amoroso sorriso, e, de mãos dadas, cúmplices, pai e filha desceram o aterro a caminho de casa.






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A estudante


Eu a vi somente por duas vezes. E se me bastou para o arrebatamento. A primeira vez caminhava em minha direção, pensativa e absorta. Sentava eu à mesa do bar, na calçada. O crepúsculo findara poucos minutos antes.  A noite chegara tímida e sem expectativa.  Repentinamente, então, surge ao longe, o vulto daquela mulher. Aproximava-se a passos curtos, devagar. Meus olhos fixaram-se naquele ser de encanto enigmático, e perscrutaram as formas, a beldade e os contornos da bela moça que andava sem pressa.  Não consegui desviar o olhar, fixo no semblante da garota.  Linda. De encantadora beleza.  Seus óculos realçavam mais a sensualidade de seu rosto, já perceptível. Fascínio. A curta distância, bem próximo a mim, ela levou a mão direita à boca e sorveu uma tragada no cigarro que segurava entre os dedos. Na outra mão, carregava ela aconchegado junto ao peito esquerdo, cadernos e pasta, em ligeiro abraço.  Não sei se ela me via ou se alguma vez reparou. Talvez não! Passou à minha frente e nesse momento sentia o perfume que a menina exalava. Inebriante, gostoso e suave. Não resisti e de minha boca escapou um balbucio: - “Linda!”  Pensei, de imediato: - Será que ela ouviu?... - Seguiu ela seu caminho. Seu perfume permaneceu pairando no ar alguns minutos.  Meus olhos continuaram a acompanhar o caminhar e o distanciar daquela bela mulher. Que suavidade! Minha vontade foi correr ao encalço, pedir-lhe seu nome, afagar carinhosamente seus cabelos. Mirar seus olhos e descobrir-lhes cor e luminosidade.  Todavia, continuei sentado, apenas seguindo com olhares o bonito e voluptuoso vulto desaparecer na esquina. Estabeleceu-se, então, nessa noite, depois do passar da menina, a magia romântica dos encantamentos. A noite, então, fez-se esplêndida e radiante. Sorri, ante o contentamento que invadia meu espírito, sentindo o pulsar e as batidas do meu coração antes empedernido, agora alegre e vibrante, como o de um adolescente enamorado. E tudo por conta do passar indiferente daquela moça de inegável candura.
A segunda vez foi-me bastante desconcertante quando deveria ter sido completamente prazeroso. Não esperava encontrá-la. Foi mero acaso. Estava eu em pé, na calçada, vendo a vida, apreciando o nada, e eis que inesperadamente ela surgiu. Muito mais bela. Eu fiquei perto, tão perto dela!... Passando ao meu lado, sem que eu esperasse, e para minha total surpresa, cumprimentou-me. Dirigiu-me palavras a mim. Desejou-me boa-noite. Não parou para conversar, mas caminhava devagar como que flutuando. Pensei ver um ligeiro sorriso em seus lábios. Surpreso e meio atordoado, respondi-lhe a gentileza, meio afônico, quase inaudível:  - Boa noite.  Minha voz soou soturna. Que horrível! Era uma oportunidade única.  Deveria tê-la cumprimentado alegremente, em alto e bom som. Mas não: fiquei acanhado, atarantado, sem jeito, quase tímido. Era tanta candura naquela garota, tanta beleza, tanta doçura que fiquei desnorteado. Pude ver seu rosto mais de perto. Ela perfeita, bela, linda. Os óculos davam-lhe uma sensualidade ainda maior. Seus cabelos, bonitos e bem cuidados, exigiam, pediam um carinho, um afago.  Ela continuou seu caminho, deixando para trás seu perfume delicioso. Seus trajes denunciavam. A blusa escolar anunciava sua condição de aluna por conta do emblema identificador do educandário. Como da outra vez, carregava os cadernos e pasta num abraço fugaz, terno, envolvente. Novamente, fiquei observando seu distanciar. Que vontade enorme de correr-lhe atrás, pedir-lhe seu nome, sorrir-lhe e quem sabe beijar-lhe. Mas não, fiquei ali parado, imóvel, deslumbrado. Como da outra vez, sua imagem desapareceu na esquina. Senti-me um adolescente tímido e desajeitado. Um impulso incontrolável de fazer-me notar gerou em minha mente a distorcida vontade de fingir-me poeta. Acreditei-me poeta e compus:  
VOCÊ!
Não sei de você!
De seus desejos, encantos, sonhos, desencantos.
Não sei de você!
De sua alma, seus segredos,
Planos e ilusões, vontades, repulsas,  alegrias e tormentos.
Não sei de você!
De seus amores, seus cantos, sorrisos e prantos.
Não sei de você!
Pensamentos, sofrimentos, de seus momentos de solidão;
Consternação, confraternização.
Não sei de você!
De seus segredos profundos,
Íntimos do ser.
Não sei de você!
De seu coração, de sua paixão,
seus dias, noites,  minutos.
Não sei de você!
Não sei de você!
O que sei eu de você?
Não sei de mim!
Sua beleza sensual?
Seu corpo?
Boca de beijos candentes,
Ardentes  e  sinceros,
assim imaginados,  sonhados, inventados?
Não sei de você!!
Não sei de tua alma,
Assim como não sei de mim.
Apenas que passa, telúrica,
Rastro de perfume no ar.
E como refrescante brisa, segue,
Logo dissipa.
Fica apenas fugaz lembrança que também dissipa no tempo.
Terminei o poema e não estava satisfeito. Pus-me a imaginar uma maneira de levar ao conhecimento daquela mulher o burburinho instalado em meus sentimentos, entregar-lhe o poema, afinal era dela, ou para ela. Será? Não seria tão só mais um devaneio? Decidi-me. Pronto! Arquitetei um plano. Pensei: - hoje novamente esperarei por ela. Ficarei de botuca na calçada. Ela virá como das outras vezes. Indo à escola. Aí aproximar-me-ei.  Perguntar-lhe-ei o nome.  Ah! Ela dirá, certamente. Direi, então, que atendendo um impulso incontrolável de meu coração e para aplacar a inquietude de minha alma, criei um poema dedicado a ela. Entregar-lhe-ei a cópia. Ela vai ler, eu sei. E o que pensará, depois? Dar-me-á um sorriso, ao menos? Permitir-me-á beijar-lhe as mãos? Tornar-se-á uma amiga?  Aceitará, de bom grado e contente, o galanteio? Depois, já no dia seguinte, me ligará falando da leitura do poema? Assim espero. Espero que me sorria. Certeza, será gentil e se agradará. Espero que sinta lisonjeada. Espero vê-la, e falar-lhe, porque vê-la certamente verei, mesmo que de forma fugidia, breve, rápida, no seu caminhar para a escola. Nossa!!!!  E eis-me ansioso por vê-la, mesmo  que nesse breve instante de passar no seu caminhar obrigatório de estudante.  Tomara que eu a veja.  Tomara mesmo é que ela fale comigo e sorria alegremente. Tomara que eu não a magoe.  Tomara que ela seja feliz. As pessoas, na maioria, são infelizes, tristes, estranhas. Acho que todas são loucas. Eu sou normal, mas, finjo-me louco, como os outros, como todo mundo, para que não me descubram diferente e me internem, sumam comigo. Por isso finjo! Decidido, coloquei em prática meu plano. No horário de seu passar rumo à escola, fiquei na calçada à sua espera, na expectativa. Ensaiei mentalmente, várias vezes, as palavras que lhe diria. Várias vezes encenei a abordagem interrompendo o passar de estranhos, esses desviavam, olhando de modo esquisito. Encenava sozinho à figura imaginária. Imaginava qual seria a reação da menina. Em pé, na calçada, envelope branco na mão, dentro o poema que entregaria para a jovem.
Ela não veio!!! Passaram vários minutos e nada da menina aparecer. Deu hora do início das aulas e obrigatoriamente deduzi que nessa noite ela ou mudou o caminho ou faltou à aula, ou talvez tenha abandonado a escola. E se ela morreu? Mudou-se para outro canto, outro bairro? Mudou de escola?  Quem saberá?  Passar ela não passou. Isso é fato. O que teria acontecido a ela? Pode ser que nada tenha acontecido. Simplesmente a estudante, nessa noite, faltou à escola. Ou algum fato gravoso impediu-a de comparecer às aulas? Adoeceu?  A imprevisibilidade!! Assim é a vida!  Imprevisível!! Surpreendentemente imprevisível!  Parece ser condição o imprevisto,  o acaso,  o inesperado. Senti-me aniquilado. Que sei eu senão que existo para a morte.  Nasci e morrerei. Duas únicas certezas absolutas. O acontecer entre esses dois pontos extremos é jogo de dados. É loteria. Destino? Preestabelecido e determinado? Sei lá! As pessoas só podem ter certeza de que estão vivos, e a morrer, por que viver é um processo para a morte. A única certeza absoluta é que nascemos e morreremos. Daí, já que é certa a morte,  melhor sorrir, cantar, apreciar, sentir, intensamente. Agir como se cada minuto fosse o último. Viver alegremente. Provar de todas as frutas os gostos e os sabores, aspirar o perfume da maior quantidade possível de flores, sentir, das mulheres, todos os amores. Conhecer de todos os fogos o fogo. Ao chorar sorrir e ao sorrir chorar, com emoção. Viver, pois, cada instante, plenamente, mas com comedimento e prudência e harmonia e honra. Caminhar. E caminhar sempre à procura de si próprio. Ao mesmo tempo, aprender a ver beleza nas coisas mais simples, no gorjeio  e canto e vôo de um pássaro,  nas peripécias de um animal qualquer. No brilho das estrelas, na chuva, no vendaval, na brisa suave,  no relâmpago, no ribombar dos trovões. No calor do sol. No cheiro da terra,  no universo. Sentir a beleza da boa música,  da poesia, da pintura, da arte, enfim... Mas, não desistirei de meu intento, Preciso acalmar o rebuliço que instalou-se sorrateiramente em meu espírito. Por ela esperarei novamente. Sim! Esperarei. Em pé, na calçada.  Ansiedade e alegria. As mãos frias. Um leve temor.  Uma certa apreensão. As horas se arrastam lentas. A noite se aproxima. Ela virá.  Ah!!!..  Certamente ela virá...               
Era noite de sexta-feira. Fria. Ele permaneceu na calçada, paciente quanto à espera: ansioso pelo encontro.  Segurava um envelope branco nas mãos, dentro o poema. Minutos se passaram muitos. Meia hora. Ela não veio. Não passou na calçada por onde era esperada. Outra vez ele pensou no que teria acontecido. Refletiu sobre as muitas razões do não aparecimento da estudante. O que acontecia? Estaria a sofrer algum mal? Sim, por que o sofrimento é próprio do homem. Todos sofrem, em maior ou menor escala, mas, todos sofrem. A dor é inerente à natureza humana, pensava ele agora apavorado, olhos esbugalhados, repetia em voz alta para si mesmo, caguejante. Só a dor remove o homem da terra esterilizante. É a alegria aquele ópio que torna a alma descuidosa e cega: - dínamo de repulsão e dispersão. Dez vezes infelizes os que passam pela vida espanejando-se na alacridade de perpétuo contentamento. São os esconjurados. Nunca compreenderão a beleza dos mistérios, nem o mistério da beleza. Pensava ele. E dizia para si mesmo, amiúde. A única força criadora e redentora é a dor. A vida só há de ser compreendida, verdadeiramente, uma vida vivida, por quem primeiro compreender a agitação e a amargura e a dor, e tirar-lhes o substrato para apreciar os balsâmicos momentos de alegria e contentamento. Respingos de felicidade. 
Ficou ele, na calçada, em pé, falando em voz alta.
Repetia essa ladainha interminável, como se cantando excelências.   
- A dor tem muitos nomes e muitas são suas modalidades, variáveis quanto à intensidade e suportabilidade. Por isso é importante e imperativo sorrir, gargalhar, brincar,  sentir a plenitude de cada momento de alegria, candura, felicidade. Felicidade é apenas uma palavra. Única. Expressa momentos de contentamento e ventura. São breves momentos. Todavia, por ser breve e passageira é eterna no seu existir porque intensa, plena, exultante.
Nosso sonhador não desistiu de abordar a estudante, mesmo sem conhecê-la posto que sequer sabia-lhe o nome, e de chofre entregar-lha o poema, e depois ficar a imaginar qual seria a reação da moça ao término da leitura. Persistente nosso homem. Ei-lo novamente, na calçada, nosso sonhador, envelope branco nas mãos, dentro o conto inspirado pela estudante, à espera.
E assim ficou ele, noite após noite, paciente e esperançoso, na expectativa de conseguir entregar à jovem o bendito envelope branco.
Ele ainda está lá, no mesmo lugar. À mesma hora. Todo dia. À espera. Envelope branco nas mãos. Olhos fixos. Balbucios. Mesma coisa toda noite. Mesmas palavras repetidas. Ninguém mais o estranha. Acostumaram com a figura daquele sujeito falando ao vento. Esperando alguém. Envelope branco nas mãos.  Horas à fio.  
Então, horas passadas, apagava as luzes, cerrava as portas e retomava ao trajeto de sua existência cotidiana, tornava ao percurso de seu tempo, nas  horas, minutos, segundos, que transcorriam, escorriam, corriam, como força, a forçar seu resistir-existir, fonte  de coragem minando o poder, o estar, o permanecer. Fechada as portas, recolhia-se. Amanhã ele voltará. Envelope branco nas mãos. Mesma hora, mesmos movimentos. Mesma cena.   


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A BEBIDA PÚRPURA E SEUS CORINGAS COM GUIZOS DA DESILUSÃO.

O período de existência de um indivíduo apresenta-se mim como um tempo de ininterrupto e constante aprendizado. Do nascimento à morte, o indivíduo pratica todos os tipos de  experimentos empíricos, sensitivos, intuitivos,  dedutivos, enfim, é um ser em mutação contínua em decorrência das experiências inferidas. Poder-se-á dizer que a “vida” apresenta e serve, -como uma cortesã-, durante o curso da existência do indivíduo,  infindáveis cálices  contendo todos os sabores e gostos,  do amargor ao néctar, da calmaria à turbulência. A grandeza do espírito do indivíduo somente será alcançada ao término de sua jornada, se houver experimentado todos os cálices, sorvido todos os sabores e sentido todos os gostos.  Ë necessário conhecer de todos os perfumes os odores, do  gosto de  todas as frutas,  da embriaguez de todas as bebidas.  Somente assim, o indivíduo será um homem, ou melhor,  será um espírito livre, um além-do-homem. Não tinha, até então, tocados com meus lábios, o cálice do arrependimento.  Bebida estranha!!  Acre, um tanto amarga.  Assemelha-se, no estertor, com o remorso. Possui o mesmo aroma de outra  ácida e adstringente bebida,  essa,  semelhante  ao fel e à quássia,  a  INGRATIDÃO,  aquela pantera de  Augustos dos Anjos!

                                                     






Um comentário:

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